domingo, 30 de novembro de 2014

Situacionismo Pop/Rock 1

Entertainment!, dos Gang of Four, é um convicto candidato ao disco mais politizado do Pós-Punk. O seu discurso não deixa dúvidas: o quotidiano das classes trabalhadoras encontra-se cativo dos interesses das forças do mercado, por isso qualquer ação individual é delimitada por contingências forjadas pelo poder financeiro. Militantíssimo, mas com arte de sobra para escapar à conversa do costume sobre comunas e desterros siberianos.



O Perfume da moda 3



O apaziguamento dos Swans 1

Comparado com o que acontecera antes, Children of God quase que passava por obra pastoral. Pedindo-se antecipadamente desculpa aos devotos dos Swans iniciais, é no duplo LP de 1987 que Michael Gira põe o seu temperamento ao serviço de uma música mais acomodada ao formato canção. Finalmente era possível sobreviver ao transtorno sónico dos nova-iorquinos sem necessidade de marcar uma consulta de otorrinolaringologia.



sábado, 29 de novembro de 2014

O brilho de Anne Clark, aka St. Vincent

Fazendo uso de uma linguagem velocipédica, Anna Calvi pedalará isolada na dianteira, mas seguida de perto por um extraordinário pelotão de senhoras, onde brilha intensamente Anne Clark, mais conhecida por St. Vincent. É a ela que agora se declara o nosso Jardim, impressionado, desde há quase 10 anos, pela assunção de uma feminilidade muito distante do universo masculino mais marialva.



quinta-feira, 27 de novembro de 2014

O Rock desfigurado dos Pere Ubu 3



Noticias à moda do Porto 1

Marcando Música Moderna, dos Corpo Diplomático, e Jorge Morreu, dos UHF, o ano zero da aventura Pop/Rock portuguesa – e, para que não restem dúvidas, o Jardim não conta com o Ié-Ié dos anos 60, nem com as sinistras operações Prog Rock da década seguinte –, o percurso soma já trinta e cinco anos, com os seus pequenos cenários e um ou outro sonho de grandeza. Fora disto estiveram sempre alguns, como os portuenses Repórter Estrábico, que registaram a patente de uma inimitável “mordacidade séria”.



terça-feira, 25 de novembro de 2014

O Perfume da moda 1

A imprensa não o larga, mas não é o peso mediático que traz Perfume Genius ao nosso Jardim. A verdade é que no meio da torrente de discos que continuam a dar à costa, Too Bright consegue voar consideravelmente acima da mediania. É, sem dúvida, música que tem o corpo na Pop, mas não deixa de pensar noutros horizontes, como revelam os pingos de irreverência sónica que, aqui e acolá, a salpicam.



Uma Deusa Viva 2



segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Uma Deusa Viva 1

Talvez Sade Adu tenha dado alguns passos em falso na sua carreira, mas à inglesa nascida na Nigéria tudo se perdoa com sentida simpatia. A sua voz tem esse sublime poder de nos pacificar perante as amarguras do quotidiano e merece um lugar especial no coração do nosso Jardim. Trazê-la aqui é uma imensa declaração de amor.



Veio do Outro Mundo

Em palco, Jimi Hendrix parecia o resultado de um pacto entre um ser humano e alguma entidade de origem desconhecida. Provavelmente, será este mistério a justificar a nítida diferença entre os vulgarmente conhecidos como “heróis da guitarra” e um homem que demonstrava uma virtude poética na utilização de um instrumento tão importante para o Rock.



sábado, 22 de novembro de 2014

Cantoras versus pin-ups 3



O Rock desfigurado dos Pere Ubu 1

Cleveland, no estado norte-americano do Ohio, é a cidade onde se encontra o The Rock and Roll Hall of Fame and Museum. É igualmente o lugar de origem dos Pere Ubu, um dos mais personalizados grupos da história da música elétrica. Em Dub Housing, de 1978, transformam a energia primordial de uma banda de garagem em pedaços de poesia à beira do colapso. David Thomas é, desde há muito, o timoneiro deste processo de aculturação que fez da crueza dos anos da juventude uma força expressiva que dura até hoje.



sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Cantoras versus pin-ups 2



Cantoras versus pin-ups 1

Algumas valem pelo aparato mass mediático que diariamente as envolve, enquanto outras só podem contar com a voz que a Natureza lhes deu. Todas são chamadas de cantoras, mas é certo que melhor seria inventar uma nova terminologia para distinguir devidamente os casos. Nicole Willis é, de certo, uma verdadeira cantora, o que faz das pin-ups que cantam uma outra coisa qualquer.



quinta-feira, 20 de novembro de 2014

O grande Toru Takemitsu

O planeta Terra está ainda longe de ser a tal aldeia global por aí apregoada, basta ver como muitos ignoram o que se passa à sua própria porta. Se a realidade fosse outra, o japonês Toru Takemitsu seria tão reconhecível como os gigantes Bernard Herrmann, Ennio Morricone e Nino Rota, mas como as coisas raramente são o que deviam, aquele que é um dos maiores compositores da história do cinema, não passa de um estranho para a maioria.



69 canções de amor 5



quarta-feira, 19 de novembro de 2014

O outro lado do Brasil

O Brasil é um autêntico continente musical, mas com muitos territórios a evitar a todo o custo. Felizmente vão chegando discos que nos fazem acreditar que as duplas românticas/sertanejas nunca representarão, verdadeiramente, aquele grande pais. Cavalo, de Rodrigo Amarante, é, em 2014, um desses poderosos antídotos.



Um fantasista nacional 3



terça-feira, 18 de novembro de 2014

Um fantasista nacional 2



Um fantasista nacional 1

Não será caso para dizer que mais vale só que mal acompanhado, mas também se faltaria grosseiramente à verdade se ignorássemos a mestria, no singular, de Bruno Pernadas, dos Julie & The Carjackers. Na aventura How Can We Be Joyful In a World Full of Knowledge?, liberta-se das obrigações mais Pop/Rock e cultiva uma atmosfera fantasista que deixa a léguas a atual produção nacional.



segunda-feira, 17 de novembro de 2014

A luz dos Talking Heads

O Jardim já visitou os 30 anos de Stop Making Sense e regressa agora aos Talking Heads pela mão de Remain in Light (1980), o lugar onde a selva africana trepa ao mais alto arranha-céus nova-iorquino e se queda a contemplar a cidade que nunca dorme. No nosso Jardim, as espécies residentes são unânimes a suspirar, dia e noite, pela luz dos Talking Heads.



Holger & Holger 4



domingo, 16 de novembro de 2014

Holger & Holger 3



O Beck intimista

Parece que foi ontem que Beck Hansen apareceu a apregoar-se loser, mas já passaram mais de vinte anos desde o inesperado sucesso de uma canção que nunca sonhou atingir a disseminação global, como então aconteceu. Depois disso, Beck já percorreu o Funk, o Rock, o Hip Hop e a Pop mais intimista, onde regressou, inspiradamente, em 2014.



Antes e depois de Dare 4



sexta-feira, 14 de novembro de 2014

O início dos Heróis do Mar

Os Heróis do Mar não surgiram do nada. Sentiu-se, desde o início, uma maturidade invulgar, em boa parte ganha na curta, mas intensa, vida dos Corpo Diplomático. O resto é história – a memória de um país cortado ao meio em Rio Maior revivificada nos mass media – e música – a influência do Pós-Punk modelada por interesses próprios, a começar pelo cuidado com a língua materna.



Antes e depois de Dare 2



quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Um pé na margem, outro no centro

Ouvir Xen de fio a pavio não esclarece a dúvida: será Arca músico, escultor ou engenheiro informático? Ou talvez o venezuelano Alejandro Ghersi reclame para si um pouco de cada um daqueles caminhos. De qualquer maneira, Xen é, no presente ano, uma aventura tão capaz de agradar aos investigadores mais audaciosos, como de produzir um impacto regenerador no mainstream menos conservador.



Antes e depois de Dare 1

Cada um terá a sua preferência, mas, na verdade, os The Human League devem o reconhecimento popular a Dare, que os reposicionou no contexto da música Pop do início dos anos 80. Antes daquele, eram um caso notável de aplicação dos ensinamentos que tinham chegado da Alemanha pela mão dos Kraftwerk, devidamente combinados com a alma sombria que alastrava a partir do norte de Inglaterra, mas quase ninguém os conhecia. Viajemos então ao antes e ao depois de Dare.



terça-feira, 11 de novembro de 2014

Holger & Holger 1

Representam dois momentos distintos da música Pop/Rock alemã, mas partilham a capacidade de terem, fora dos seus lugares de origem, conquistado uma identidade própria. Holger Czukay, ex-Can, e Holger Hiller, antigo membro dos Palais Schaumburg, merecem toda a nossa atenção e justificam a compra de um bilhete de comboio para a velha Germânia, onde o nosso Jardim se banhará em experiências do Quarto Mundo ou na Neue Deutsche Welle, a New Wave lá do sítio.



69 canções de amor 3



segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Ventos do Pós-Punk

Por agora, trata-se somente de um pré-aviso do que está para chegar. Os ingleses Au Pairs são a guarda avançada oficial da horda Pós-Punk que o nosso Jardim exporá ao longo de várias semanas. Dos muitos possíveis, Sex Without Stress é o nosso aperitivo para a vertigem de um extraordinário pedaço da história do Pop/Rock.



Caídos do Céu

Os Alpha irromperam na Pop do final dos anos 90 pela inspiração de Come From Heaven, disco largamente confecionado à sombra de um vincado sentimento de melancolia. Acertadamente, os Alpha desalinham-se de qualquer tendência urbano-depressiva e contrapõem ao miserabilismo de muitos uma sensibilidade outonal apropriada para as horas mais ébrias da madrugada.



domingo, 9 de novembro de 2014

69 canções de amor 2



69 canções de amor 1

69 Love Songs é um triplo CD dos The Magnetic Fields. Chegados ao fim da travessia, pergunta-se, com perplexidade, como é possível Stephin Merritt escrever e juntar sessenta e nove canções sem nunca renunciar a uma bitola de sofisticação capaz de fazer inveja ao melhor dos ourives. No território da canção Pop, não há, nos últimos vinte anos, ninguém que se lhe compare.



sábado, 8 de novembro de 2014

Microclimas continentais 7



A cintura de Anna Karina

Até aos anos 90 Portugal tinha apenas dois canais de televisão, mas não era preciso esperar pelo cometa Halley para espreitar o mundo de Lang, Hawks, Bergman, Kurosawa ou César Monteiro. Hoje a sua aparição – ou de outros do género – assemelha-se a um milagre. A verdade é que nunca o ruído se pareceu tanto a um deserto. Como memória, fica a linha de cintura de Marianne/Anna Karina, em Pedro, o Louco, de Jean-Luc Godard.



sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Microclimas continentais 6



O verão possível

Desenha-se o inverno no horizonte e até os corações mais empedernidos anseiam pelo regresso das cálidas tardes de agosto. Mas como ninguém descobriu ainda a chave para mudar o ritmo inexorável da Natureza, resta, por agora, o artifício de uma heroína francesa dos anos 80, Isabelle Antena, que imaginou, com toda a certeza, Camino Del Sol para os dias mais chuvosos do calendário.



quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Outra vez Calvi

Regressa Anna Calvi ao nosso Jardim. Ainda do seu disco de versões editado este ano, cabe agora a vez a Ghost Rider, dos Suicide. O que poderá mais ser dito da extraordinária Calvi? Talvez que os nova-iorquinos tenham, por um mistério imperscrutável, sido induzidos a escrever em 1977 uma canção para uma voz que só chegaria a este mundo três anos depois.     



Os herdeiros da rua da Beneficência

Os problemas começam pelo nome, AbztraQt Sir Q, notoriamente dissuasivo da atenção do gosto comum. Depois, o contacto com a música também não será propriamente fácil, talvez porque o grupo seja dos poucos que agarraram, firmemente, as sementes lançadas ao vento por aquela criatividade que, tantas vezes, transformou o Rock Rendez-Vous num audacioso laboratório sónico. São, portanto, legítimos herdeiros da velha magia da rua da Beneficência.



segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Microclimas continentais 2



Microclimas continentais 1

Fora da hegemonia anglo-americana, floresceram, nos anos 90, vários microclimas da música Pop mais eletrónica – Escola de Viena e French Touch, por exemplo. Mas aquilo que parecia sólido e capaz de regularmente dar bons frutos, acabou por entrar em lenta agonia, com raras aparições ao longo dos últimos 13/14 anos. E, até ver, nem a febre das reedições se lembrou de devolver esta gente à vida.



domingo, 2 de novembro de 2014

Amigos em Portugal 4



Os xamãs do Hip Hop

Há quem lhe chame concerto, mas talvez seja mais apropriado considerar as quase duas horas em causa uma conferência xamânica em pleno Cais do Sodré. Os Shabazz Palaces passaram por Lisboa e demonstraram o poder da sua música, um feitiço capaz de mobilizar o corpo para uma entrega apaixonada ao discurso que as vozes e as máquinas da dupla vão, rigorosamente, entrelaçando.



Amigos em Portugal 3



sábado, 1 de novembro de 2014

De volta ao Minho

Os putos vêm só para dar um fix
Estendem-se pelo quarto a folhear comics
Esquecem gringas a marcar os livros
E morrem de volúpia num esgar feliz
Alguém me faz um bico

Não interessa se é noite ou dia
Os filmes em que vivem são de fantasia
Por entre trevas e mortos vivos
É chinês o facho que os alumia
Alguém acende um bic

Devaneiam-se incríveis planos
Num retorno extemporâneo aos verdes anos
Trincando velhas pizzas ressequidas
Aos polícias e ladrões jogamos
Alguém se afunda a pique

Alguém me faz um bico
Alguém acende um bic
Alguém se afunda a pique
Alguém se balança
E há mesmo alguém que dança...
Ai que eu quero vomitar!
Velocidade escaldante